sábado, 9 de junho de 2012

(Uni)Versar

Eu faço versos como quem morre ou talvez faça versos como quem vive de insistir em esperanças esvaziadas. Eu faço versos para fugir de mim e para não deixar o outro escapar, ir embora de mim. Mas quem sabe se faço algum verso decente? Eu não sei e ninguém nunca me diz. Se me dizem a impressão não se torna verdade; a impressão se torna uma marca, mais uma das marcas. Na verdade, acho que não faço verso algum. Toda palavra que transborda é ausente de significação ou tão cheia dela que explode em tintas. Não sei lidar com os trabalhos e a polidez denotativa. A miscelânea conotativa faz de mim um mero figurante. Eu não faço versos; eu inflo, vou até o topo e me implodo. Eu esvazio o vazio para enchê-lo novamente de impurezas. Eu não sou poeta, nem escrevo prosas; eu sou mundana e giro neste mundo em desespero - desesperança de não pertencer ao aqui. Eu escrevo gritos de auto-flagelo. Escrever é viver mil vezes; escrever é amar mil vezes. Escrever é nunca desistir. Eu escrevo porta-retratos de fotografias sépias. Fotografo mil vezes o momento para tentar dar movimento àquilo que foi congelado na memória. Eu tenho mil álbuns de letras tortas e muitos deles sem fotos. Eu escrevo para dizer sim e movimentar os acordes alveolares. Eu escrevo a covardia da parole. Eu escrevo os cabelos de Sansão jogados ao chão. Não escrevo haxixe a Baudelaire, nem ópio a Poe, escrevo palavras derrotadas e elas mesmas são meu vício. Eu falo daquilo que poderia ter sido como trabalhos de Hércules que nunca pude cumprir. Eu não faço versos; eu choro versos. E que ninguém se iluda se algum dia os versos parecerem simples, pois lágrimas são essencialmente prolixas. Eu escrevo ambíguas veleidades e duvido das certezas. Eu poetizo a dúvida e é isso que mata. É, eu faço mesmo versos como quem morre.

sábado, 19 de maio de 2012

Lenga-lenga


Os homens têm essa vantagem de ver as coisas de um modo simples o que, infelizmente, não acontece com as mulheres. Ontem decidi comprar uma lingerie (ponto pra mim), passei um tempão escolhendo algo que, em minha opinião, nós dois iríamos gostar. Bem, pra uma pessoa que tem uma baixa autoestima como eu isso é algo realmente difícil. ‘E daí?’, você diz. E daí que a gente vai tentando fazer as coisas de um modo diferente até elas se encaixarem e você realizar que, putz, você deveria ter feito isso há algum tempo. Casar é difícil pra qualquer pessoa – o dia-a-dia acaba virando um remoer de problemas externos, de cansaço físico e mental, de coisas que deveríamos jogar fora. Quando uma mulher casa com um homem, ela sente, mais que nunca, a necessidade de ser, de se sentir mulher. Foi isso que quis fazer ontem após algumas semanas de cansaço e de muitas críticas internas e também para comemorarmos nosso 2 meses juntos. Tirei várias fotos e fiquei algum tempo em dúvida se deveria ou não enviar. Nothing ventured, nothing gained... Enviei. ‘Legal’ não era de fato a resposta que esperava. Fiquei tão desapontada, não puta, mas triste. Triste por não conseguir despertar em você tudo que gostaria de despertar, triste por profanar o lugar sagrado que seu trabalho é pra você, triste por perceber que você preferiria que fosse uma foto de um prato de comida. Fiquei triste também por perceber que consigo despertar alguém coisa em você (apetite, colaboração, raiva), mas nunca consigo despertar seu desejo quando quero. E eu só consigo me sentir frustrada com isso.
É isso. Sinceramente não espero que você compreenda tudo isso ou minha reação a tudo isso. Acho também que estou fazendo uma besteira muito grande enviando esse e-mail, mas é assim mesmo.

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Quase 1 ano sem postar aqui...
As coisas vão ficando mais intensas e silenciosas com o tempo e as postagens causam um certo desconforto.

Jardim

Quando passei por esse jardim de luz de sol entrecortada pelos galhos das árvores e de folhas velhas, caídas, já sem vida, no chão, lágrimas de algo que não sei descrever brotam dos meus olhos. Poderíamos ser tantas coisas naquelas horas que precediam um crepúsculo cor de púrpura. No entanto, conseguimos ser somente você e eu – humanos, demasiadamente humanos, já diria o filósofo que, assim como nós, também não soube amar nem se deixar amar. A luz do sol, mesmo quando fraca, me incomoda e desfoca tudo que está ao meu redor. Talvez seja melhor assim, eu e minhas lembranças distorcidas embaladas por uma caixinha de música imaginária.

Ainda guardo uma caixinha de música que ganhei quando tinha três anos. Meu pai se embalava com aquela canção todos os dias. Talvez ele nunca tivesse aceitado o fato de eu ter crescido e acho que nem eu aceitei direito. A brisa entrecorta minha pele enquanto minha visão turva imagina um sorriso teu. Você nunca sorriu verdadeiramente nas fotos em que estávamos juntos e te ver feliz com outras pessoas era tudo que me restava. Eu consegui fazer com que você me amasse como sempre sonhei, só não consegui transformar você em meu lar. Ainda bem que você passava os finais de semana fora, assim eu teria tempo – tempo pra sentar no sofá e perceber que você, apesar de tudo, era meu pedacinho de paz. Seria possível amar e odiar alguém ao mesmo tempo e na mesma proporção?

Há tulipas no jardim, minhas flores favoritas. As tulipas são belas, coloridas e reservadas, somente uma abelha muito abelhuda consegue saber o que realmente há em uma tulipa. Você nunca soube que eu escrevo. Ainda bem porque você me diria que isso é coisa de adolescente e que preciso amadurecer. Eu acho que preciso amadurecer, mas se sequer a dor me fez ser alguém diferente, como conseguiria isso? Eu gosto de tirar fotos de pessoas que não sou e de pessoas que não conheço, pois me sinto confortável. Gosto de sorrir descaradamente embora sinta que cada dia a mais me sinto cada vez menos feliz, assim como um pássaro que canta não por felicidade, mas por instinto. Disfarçar é instinto de sobrevivência.

Há muitos pássaros por aqui, mas eu escuto uma música qualquer nos fones de ouvido. É incrível como as dores humanas são semelhantes e é incrível como as alegrias são discrepantes. Discrepante é todo esse colorido em contanto com alguém gris como eu. Eu quis ser a mais bela mulher do mundo pra você, mas eu não fui. Não fui pra mim mesma e não sei o que dizer se fui pra você, afinal você nunca me dizia nada, mas sempre achei que me acordar com beijos de manhã significava alguma coisa. A luz do sol em contato com as lágrimas causa de enorme desconforto nos olhos, mas ainda posso ver aquilo que as pessoas viam em você quando você me olhava. Elas diziam que você me amava profundamente, mas eu nunca pude ver seus olhos brilhando pra mim. Eu tentei ver teu brilho e brilhar pra você como ninguém no mundo tentou. Contudo, precisava me libertar dessa cegueira, precisava que você me libertasse dessa cegueira e acho que você lavou as mãos. O sol é somente o sol; a brisa é somente a brisa; uma flor é somente uma flor... O que eu poderia ser senão somente eu mesma? O que poderíamos ser senão nós mesmos?

Assim como esse belo jardim tem um portão de saída, eu me despeço dos lindos sonhos que tive com você como protagonista. Minha figura não pode ser nada além de triste e não pode fazer seus olhos brilharem de alegria por mim. Desculpe-me, mas agora preciso fugir, fugir de mim.