quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Offspring

Nosso amor começou numa noite dessas, amenas, de primavera. Eu acreditei em amor à primeira vista quando a lua refletiu no verde escuro de seus olhos – nada foi tão belo quanto aquele momento. Eu nasci para você. Você nasceu para mim. Nascemos. Juntos fundimos nossas vidas continuamente. Fomos um, dois, dez, um milhão e depois um novamente. 

Vivemos as cores das noites em claro e a monotonia dos dias sem cor, você e eu. Fomos guerreiros e senhores de nossas próprias guerras. Rastejamos e nos reerguemos, você e eu. Celebramos vitórias silenciosas e fomos plenos de tudo e de nada.  Fizemos um milhão de experimentos durante nossa inexperiente trajetória. Nós nunca crescemos, sempre fomos peter-panescos. Nós nascemos mortais, mas vivemos como imortais. Queríamos viver cem anos, mas fizemos tudo errado.

Nos álbuns silenciosos cheios de som e fúria que guardo, eu escuto suas declarações de amor. Eu escuto seus muitos eu-te-amos. É a minha biografia sendo contada pela tua voz. É a minha voz abafada de consternação e maravilhamento de nossas ideias e sentimentos. Nesses álbuns silenciosos estão todas as viagens que não fizemos, todos os aniversários que não nascemos, todo o pão que não compartilhamos. Neles estão toda a vida que vivemos e a que deixamos de viver


Todas as canções que você fez para mim ainda ecoam no silêncio da tua voz, elas são minhas canções de ninar. Até hoje deito nos divãs imaginários dos sonhos para ouvir teus conselhos e sons. Releio todas as cartas que não escrevestes e rabisco falsificações estúpidas da tua assinatura. Oro tuas orações e acordo de joelhos. E te bendigo resilientemente, sabendo que tua partida é minha maldição. Mas eu te bendigo. Bendigo-te pelo amor que nunca morre e pela eternidade que nunca chega. O teu nome é a minha prece. Que assim seja.


Para meu pai, que deixou o ninho vazio

Nenhum comentário: