domingo, 15 de junho de 2008

Volúpia

Eram dez horas da noite daqueles dias ambíguos. Daqueles dias que não fazia nem calor, nem frio. Naqueles dias meu coração não parava, não mais sabia o que sentia. Foi assim que me vi caminhando por uma dessas ruas qualquer e me flagrei, parada, em uma dessas esquinas duvidosas de uma rua que não se sabe o nome. Não sabia nem o meu nome. Contudo, queria esquecer o teu. Teu nome ecoava entre os intervalos quase que agonizantes da minha respiração. Era como se pudesse te ouvir nestes entremeios, sentir tua língua no meu colo e suas mordidas latejando em meus seios.

Lembrei-me de Shakespeare, soneto 116: [Love] is the star to every wandering bark, Whose worth’s unknown, although his height be taken.

Olho para o céu. Procuro nossa estrela. Não, não eram estrelas; eram seus olhos as fontes de luz de todas as noites. Aliás, todas as noites são tuas. Não existe noite sem teu cheiro, sem teu colo, sem teu sabor, sem tua saliva. E se não há noite, os dias se tornam dormentes. Hoje está calor. Bem, não sentia calor há dez minutos atrás. Mas tua lembrança me aqueceu de forma tão arrebatadora que poderia até ouvir nossos sussurros e uivos e gritos e todas as declarações.

A barraca que vende sorvete estava aberta. Comprei um sorvete. Sorvete de chocolate, da cor da sua pele. Era do gosto da tua língua. Olhei para os lados, só a vendedora estava ali comigo. Não, não comigo; ela estava ali naquele lugar. Acho que eu era a única louca a degustar, saborear um sorvete em uma noite tão fria. E se o fazia era por causa do calor que me transbordava. Torcia para não encontrar ninguém conhecido. Não queria dar satisfações, nem responder perguntas. Toda pergunta feita em momentos inoportunos se torna idiota, pelo menos para mim. E aquele momento era teu.

Meia-noite. Mais uma noite. Uma noite a menos?

Volto para casa. Essa casa que é minha, mas que está muito mais cheia de ti que de mim mesma. Tomo um banho e tuas mãos continuam ali; a água escorre violentamente em meu corpo e as tuas mãos continuam ali. Coloco um perfume estratégico em um lugar quase invisível e penetrado somente por suas narinas. Todavia, não consigo sentir nenhum outro cheiro que não seja o teu. Volúpia. Esta palavra não saia da minha cabeça. O lençol da cama era vermelho. Não te encontrar ao meu lado era me arrancar o âmago dos prazeres, era não me sentir, era não mais desfalecer cansada em teus braços, era não mais cravar minhas unhas curtas em tuas costas.

Mas não consigo ficar parada. Não consigo suportar este oco eco que escuto ao gritar teu nome. Procuro-te em outros corpos. Quem sabe um dia eu te encontro ou me perco de vez.

6 comentários:

oconselheiro disse...

Quente hein? Calor... lençol vermelho... Sem nome... bem contemporâneo! Gostei! Dá pra virar um monólogo... Tu ta escrevendo cd vez melhorbutterfly! Bjus

Nara Sales disse...

Maravilhoso!
Adoreei os textos!
O "Carta a um amor bandido"
Lindíssimo!
amei!
Beijos!

Hudson Pereira disse...

E essa paixão te pinta toda de vermelho.
Te cora toda num calor espantoso.
Ah, paixão, sempre tão devastadora.
Sempre tão inspiradora!

beijos querida!

Maykon disse...

Uiaaa

Cada vez escrevendo melhor hein ? ;)

Eu vo manda um desses textos aii seus pro Jô

Dai ele chama vc lá e vc fala de mim topa? ^^

Bjaoo

Unknown disse...

Demais, menina...adorei!!!

Thúli Cavalcânti disse...

Que lindo!!!!!Estou sem palavras pra dizer como o seu texto me prendeu e me conquistou! Sem palavras, amiga! Beijos!