Nosso amor começou numa noite
dessas, amenas, de primavera. Eu acreditei em amor à primeira vista quando a
lua refletiu no verde escuro de seus olhos – nada foi tão belo quanto aquele
momento. Eu nasci para você. Você nasceu para mim. Nascemos. Juntos fundimos
nossas vidas continuamente. Fomos um, dois, dez, um milhão e depois um
novamente.
Vivemos as cores das noites em
claro e a monotonia dos dias sem cor, você e eu. Fomos guerreiros e senhores de
nossas próprias guerras. Rastejamos e nos reerguemos, você e eu. Celebramos
vitórias silenciosas e fomos plenos de tudo e de nada. Fizemos um milhão de experimentos durante
nossa inexperiente trajetória. Nós nunca crescemos, sempre fomos
peter-panescos. Nós nascemos mortais, mas vivemos como imortais. Queríamos viver
cem anos, mas fizemos tudo errado.
Nos álbuns silenciosos cheios de
som e fúria que guardo, eu escuto suas declarações de amor. Eu escuto seus
muitos eu-te-amos. É a minha biografia sendo contada pela tua voz. É a minha
voz abafada de consternação e maravilhamento de nossas ideias e sentimentos.
Nesses álbuns silenciosos estão todas as viagens que não fizemos, todos os
aniversários que não nascemos, todo o pão que não compartilhamos. Neles estão
toda a vida que vivemos e a que deixamos de viver
Todas as canções que você fez
para mim ainda ecoam no silêncio da tua voz, elas são minhas canções de ninar.
Até hoje deito nos divãs imaginários dos sonhos para ouvir teus conselhos e
sons. Releio todas as cartas que não escrevestes e rabisco falsificações
estúpidas da tua assinatura. Oro tuas orações e acordo de joelhos. E te bendigo
resilientemente, sabendo que tua partida é minha maldição. Mas eu te bendigo.
Bendigo-te pelo amor que nunca morre e pela eternidade que nunca chega. O teu
nome é a minha prece. Que assim seja.
Para meu pai,
que deixou o ninho vazio.